sábado, 3 de fevereiro de 2018

Direita cristã, acabou! - parte 39: Lula de novo com a força do povo

Abigail Pereira Aranha

Nenhum analista político da direita entendeu até agora, fora poucos como Reinaldo Azevedo, por que Lula tem chances reais de ganhar a eleição para presidente neste ano. Não há pesquisa eleitoral desde 2016 em que Lula não ganhe em qualquer cenário imaginável. O candidato da direita, Jair Bolsonaro, não apenas não chegava ao segundo lugar em quase qualquer cenário imaginável, ele também não ganhava em qualquer segundo turno imaginável. Aécio Neves, o concorrente de Dilma Rousseff em 2014, e vítima de um processo no STF tão absurdo que o próprio PT o defendeu publicamente, não é sequer pré-candidato.

Ai, quem leva a Folha de São Paulo e o Instituto Datafolha a sério? Quase 6 milhões só de seguidores da Folha no Facebook. Quem faz essa pergunta tem quantos? O canal petralha Diego González - O outro lado da informação já tem quase 60.000 inscritos. Quantos conservadores no Youtube têm mais que isso? Quantidade não é sinal de qualidade? Certo. Mas quantos direitistas não têm nenhuma das duas?

Para começar, Lula foi reeleito presidente da República no ano seguinte ao escândalo do Mensalão. Veja bem, o escândalo do Mensalão, não o Mensalão em si. Não apenas reeleito, ele ganhou o que na época foi a terceira maior votação da história da humanidade. A votação para Dilma Rousseff na sucessão dele foi ainda maior. Quem entre os liberais e conservadores sabe explicar isso?

E depois de toda a corrupção do governo PT, corrupção da educação com empobrecimento dos currículos e do sistema seletivo, corrupção do jornalismo para fazer propaganda "progressista", corrupção de estatísticas para fazer propaganda política ou ideológica, corrupção das leis e da aplicação das já existentes, corrupção da economia usando dinheiro público para perseguição política ou favorecimento de colaboradores, foram os outros partidos que ficaram com vergonha, alguns até de se denominarem partidos. O PMDB virou MDB, o PFL virou Democratas, o PTdoB virou Avante, o PEN virou Patriotas. É como se alguns pardos honestos se declarassem índios porque uma quadrilha de negros cometeu um crime escabroso. Mas o pior é que gente da direita fez campanha contra "os políticos". Quando eu disse no Twitter "dizer que os políticos são corruptos é como dizer que os negros são bandidos", "temos que começar discutindo ISSO", ganhei uma resposta burra de uma conservadora e virei assunto de conversa paralela sobre o meu perfil com putaria.

Até, a grosso modo, a primeira Marcha das Vadias, antifeminismo era coisa de provincianas semianalfabetas e tarados mal sucedidos também provincianos; antiesquerdismo era coisa de neto de condenado da Justiça do Trabalho; falar de apelo sexual na televisão e nas músicas era coisa de suburbanas disformes e fracassadas ou de esposas frígidas de pregadores. Não foi um avivamento da inteligência do meio conservador, conservador tanto na política quanto na religião, que fez o Conservadorismo ser levado a sério. O movimento esquerdista se rebaixou muito em relação a ele próprio 30 anos atrás e salvou a direita. Se Dilma Rousseff não tivesse tropeçado nas próprias pernas, já estaríamos em 15 anos ininterruptos do PT, provavelmente ainda com 60, 70 por cento de aprovação. E mesmo com uma rejeição de 60, 70 por cento, a direita ainda deu duro em quase dois anos com as maiores manifestações de rua da história do Brasil para conseguir um meio impeachment (ela perdeu o cargo, mas continuou com os direitos políticos).

O meio liberal conservador cristão não é menos burro que a esquerda moderada, ainda mais se os desse meio estão certos quando dizem que a esquerda (alguns dizem o PT) sabotou o sistema educacional do Brasil. Ainda mais que eles foram alfabetizados, a maioria, no governo Fernando Henrique Cardoso ou no governo Lula. O próprio entendimento deles de cultura é macaquear os avós com diploma universitário quando tentavam impressionar a maioria analfabeta ou semianalfabeta do Brasil da época. Alguns deles realmente estão devorando livros de alto nível, a maioria de meados do século XX pra trás, para discutir com as lésbicas semianalfabetas e aspirantes frustradas a peguete do tráfico que entraram às legiões nas nossas universidades. Mesmo assim, um direitista médio não é melhor habilitado que um esquerdista médio para ler, entender e comentar um artigo de jornal, um vídeo ou uma postagem de tamanho médio no Facebook.

Os conservadores cristãos e os liberais ainda tratam a coisa toda como uma campanha municipal para recuperar uma prefeitura do interior para uma dinastia falida de coronéis decadentes. Eles lidam com as alas mais ridículas e macabras da esquerda como quem rabisca porta de banheiro no Ensino Fundamental para fazer bullying contra um garoto de duas séries abaixo (os memes de liberais e conservadores são quase todos assim).

Nenhum direitista brasileiro se lembra de que Hillary Clinton ganhou a eleição de 2016 nos Estados Unidos no voto popular, e Donald Trump só é hoje presidente por causa do Colégio Eleitoral. Luciano Ayan, que não é dos piores analistas liberais, ainda não me respondeu como a existência de dezenas de bancos estaduais públicos há 20 anos atrás, quando a Vale do Rio Doce e a USIMINAS também eram empresas públicas, não contraria a tese de que o esquema do PT na Petrobrás se deve ao "Estado inchado". Carlos Bolsonaro nem viu eu comentar no perfil dele no Facebook sobre o artigo do Justificando / Carta Capital sobre o caso do Héberson de Oliveira, que ficou preso sem julgamento por quase dois anos acusado de um estupro de uma menina que ele não cometeu, e que o artigo foi publicado enquanto o pai dele era condenado por apologia ao estupro. Nenhum liberal explicou por que a qualidade medíocre da telefonia brasileira antes da privatização era culpa da existência da Telebrás e depois da privatização é culpa da agência reguladora, ou porque é mérito da privatização que o pobre tenha celular e é culpa do governo que o serviço telefônico seja horrível. Nenhum conservador comentou que o projeto de lei de Jean Wyllys para regulamentação da prostituição teve como relator o deputado Pastor Eurico e este o rejeitou citando um trecho da feminista Simone de Beauvoir.

O que a direita produziu desde 2014? Propaganda eleitoral antecipada para Jair Bolsonaro (para superar a apuração fraudada na eleição), brigas internas, uns chamando Fulano de esquerdista (até Jair Bolsonaro já foi chamado de estatista), jornalistas e comentaristas de direita perdendo espaço na mídia tradicional, outros com espaço de antipetismo mixuruca, musas conservadoras desmascaradas, comitês antissexo denunciando defesa da pedofilia aqui e ali, memes mostrando as feministas como lésbicas gordas peludas que pregam o ódio aos homens e incentivam as garotas adolescentes a dar pra eles.

Para completar a tragédia, os liberais-conservadores em geral desconhecem tanto a própria ideia de análise política que já interpretam a crítica interna como traição ou como adesão ao discurso inimigo, isso quando eles não a recebem com sincera falta de interesse. Para eles, você precisa ser esquerdista para reconhecer, como eu fiz, que Jean Wyllys fez um bom trabalho em criar um projeto de lei para regulamentar a prostituição; ou para reconhecer, como eu também fiz, que Vanessa Grazziotin merece elogios por criar um projeto de lei para estender a licença-paternidade para 120 dias; ou para reconhecer, como eu também fiz, que Lola Aronovich teve alguma honra em dar no Twitter o nome do verdadeiro autor de uma página criada para incriminar pelo menos dois conservadores, o Émerson Eduardo Rodrigues Setim e o Cauê Felchar, enquanto o portal R7 sustentava a armação. Para eles, eu sou feminista por defender a prostituição e a licenciosidade e sou esquerdista por pregar o ateísmo. E só porque eu não sou conservadora nem tive muita fama, isso não justifica que eu tenha sido ignorada. Afinal, eles já ouviram Andrea Dworkin e Gail Dines para fazer documentários contra a pornografia, e copiaram um texto de uma feminista contra a "putaria" da Rede Globo.

Os liberais e os conservadores ainda vão entender da pior maneira o que Reinaldo Azevedo quis dizer com "se todos são mesmo iguais, então Lula é melhor".

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